quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Circo da Notícia


"ESQUEMA DANTAS"

É Natal! Queremos a lista de presente

Por Carlos Brickmann em 23/12/2008


A Fenaj – Federação Nacional dos Jornalistas, atirou na mosca: nada é mais importante para nossa categoria profissional, neste momento, do que saber quem são os jornalistas que, conforme palavras do delegado Protógenes Queiroz, da Polícia Federal, "abastecem Daniel Dantas ou faziam manifestação de mídia a favor dele". A denúncia, da maneira como foi formulada na entrevista do delegado, coloca todos sob suspeita – amigos de Dantas, inimigos de Dantas, jornalistas que jamais lidaram com esse tema. A Fenaj pediu esclarecimentos à Polícia Federal e ao ministro a que a PF está subordinada, Tarso Genro, da Justiça.

O repórter Daniel Roncaglia, do Consultor Jurídico, procurou o delegado Protógenes Queiroz, que comandou a Operação Satiagraha e considera Daniel Dantas um bandido. Queiroz se recusou a falar; de acordo com o ConJur, disse que o repórter que o procurou "é um idiota" e bateu o telefone.

Resta, portanto, o caminho procurado pela Fenaj para saber quais são os acusados (e ouvir sua defesa). Dizem os ofícios da Fenaj:

"(...) a não divulgação dos nomes de eventuais culpados, se existirem de fato, coloca sob suspeição toda a categoria (...). Esta federação tem o dever de se opor a qualquer tentativa, por mais dissimulada que seja, de enlamear a imagem dos jornalistas brasileiros, fazendo supor que todos fossem corrompíveis, razão porque vem a V. Excia. pleitear a divulgação urgente da referida lista de nomes, se existir, com as devidas provas do suposto envolvimento, sob pena de todos pagarem por alguns".

A lista de jornalistas que o delegado considera envolvidos no "esquema Dantas" seria o melhor presente de Natal para a profissão. Primeiro, por tirar as acusações do lamacento terreno da fofoca e do diz-que-diz-que e levá-las à luz do Sol, onde o mau procedimento profissional pode ser julgado pelos colegas jornalistas e pela Justiça; segundo, por expor os acusadores à defesa de quem foi acusado. É fácil dizer que há muita gente ligada ao crime – fácil e óbvio. Difícil é dizer quem são e provar seu envolvimento. Os jornalistas podem contribuir para esclarecer essa história – e melhor o farão se puderem trabalhar livres de suspeitas e de suspeitos.



A saúde do governador

O colunista Cláudio Humberto informou, em seu blog, que o governador paulista José Serra se submeteu a um cateterismo no Hospital Sírio-Libanês, no dia 13/12. Foi, segundo Cláudio Humberto, um procedimento rápido: Serra passou por lá de madrugada e saiu logo depois do cateterismo.

Mas cadê o resto da imprensa, que não foi atrás da informação, para confirmá-la ou desmenti-la? A assessoria de imprensa de Serra deu um meio-desmentido: disse ao próprio Cláudio Humberto que desconhecia o fato. Mas não disse que o fato não ocorreu. E o estado de saúde do governador José Serra é hoje de interesse nacional: como possível candidato à Presidência da República, o público tem o direito de conhecer seus eventuais problemas médicos.



Blindagem vermelha

O ditador de Cuba, Raúl Castro, não deu entrevistas durante o tempo em que esteve no Brasil. Quando um jornalista ousou perguntar-lhe sobre os dissidentes fuzilados em Cuba, explodiu, disse ao jornalista o que é que deveria perguntar-lhe e não respondeu. E este colunista, certamente por falha na pesquisa, não se recorda de ter visto nenhum protesto contra a falta de entrevistas.



Acusação sem defesa

O Ministério Público Estadual acusa a empresa Home Care Medical, envolvida no caso da Máfia dos Parasitas, de contribuir com 3,5 milhões de reais para 26 candidatos a prefeito, em três estados. O problema é que, na reportagem sobre o assunto, sai a lista dos que teriam recebido a doação, mas ninguém foi procurado para apresentar sua versão. Já haveria informações disponíveis de que essa empresa estaria sendo investigada por atividades ilegais? Se não houvesse informações, como os candidatos saberiam que não deveriam aceitar seus recursos? De acordo com a matéria, as doações eram ilegais. Que explicação oferecem os beneficiários para ter recebido doações ilegais?

A síndrome da matéria pronta, recebida quentinha e com muitas informações, embora parciais, continua prejudicando a reportagem. No caso, um pouco mais de trabalho poderia até complicar a vida dos acusados. Se não tivessem boas explicações para receber doações ilegais, que manobra teriam feito para aceitá-las?



Os 40 anos

O episódio do drible que a equipe do Jornal da Tarde deu na Polícia Federal, que queria apreender o jornal no dia do Ato Institucional nº 5, desdobra-se em muitas histórias. Mário Marinho, ótimo repórter, lembra a distribuição de mão em mão, enquanto a Polícia Federal tentava apreender a edição inteira.

Os garotos que vendiam jornais na rua costumavam assinar um protocolo quando recebiam seu reparte (e, no dia seguinte, pagavam o que tinha sido retirado). No dia 13 de dezembro de 1968, no meio da pressa e da confusão, a garotada pegava o jornal sem pagar nada, sem assinar nada. E saía na corrida, para vender o mais rápido possível. Outro grupo, de que o próprio Marinho fez parte, junto com boa parte da equipe de Esportes, pegou um montão de jornais e passou a distribuí-los gratuitamente no meio do trânsito. Avisavam: pega logo que a polícia está apreendendo. Solidariedade total: não sobrou um só jornal. O pessoal pegava, dava uma rápida olhada e escondia o exemplar, para não ser apreendido.

O mais interessante é que ninguém teve medo. O pessoal que distribuía o jornal não ficou preocupado por entregar o jornal sem recibo, sem nada. Os jornalistas que participaram da entrega não temeram ser presos. Naquela empresa, especialmente naquele momento, sabia-se que haveria cobertura por parte da direção: se alguém fosse preso, logo apareceria um Mesquita, acompanhado de bons advogados (na época, com a ditadura ainda bamba, isso ainda era possível) para libertá-lo. E o pessoal que distribuía o jornal sem comprovante sabia que o importante para a direção da empresa era menos o dinheiro e mais, muito mais, a circulação das idéias e a luta contra os maus tempos que estavam chegando.

Foi um dia triste. Mas o episódio foi bonito.



O sapateador

Duas informações que apareceram com muita discrição no noticiário sobre os sapatos atirados contra o presidente americano George Bush, em Bagdá:

1. O repórter Al Zaid, que jogou os sapatos, é membro do Partido Comunista Iraquiano. Agiu como ativista político, não apenas como cidadão indignado.

2. Em suas reportagens de Bagdá para a TV Al Baghdadiya, concluía dizendo "Al Zaid, da Bagdá ocupada". É tudo verdade: Al Zaid é o nome dele e Bagdá, como o restante do Iraque, está ocupada. Mas não combina com a imagem de ditadura que se faz hoje do Iraque. Frases desse tipo não eram aceitas no regime iraquiano anterior, de Saddam Hussein.

A propósito, boa parte do noticiário da grande imprensa sobre o repórter Al Zaid teve como origem um site muito bem-feito, o Vermelho, do PCdoB. Endereço eletrônico do Vermelho, onde esse tipo de notícias do Iraque sai em primeira mão: www.vermelho.org.br



Rigoroso inquérito

É preciso acompanhar de perto o caso da agressão do repórter Sérgio Gobetti por truculentos seguranças apelidados de "policiais legislativos" na Câmara dos Deputados. Gobetti, do Estado de S.Paulo, entrou correndo no plenário, mas com crachá e mostrando o documento. Mesmo assim, dois gorilas o seguraram por trás, um deles pelo pescoço. Não é a primeira vez: este colunista, por exemplo, não chegou a ser agredido, mas seguranças (desculpe, "policiais legislativos") insistiam primeiro em chamá-lo de "Baltazar"; e, ao ver que os documentos estavam em ordem, tentaram provar que o crachá tinha sido cedido a "Baltazar" para que ele entrasse clandestinamente no plenário da Casa do Povo.

O perigo é que as investigações se limitem ao "rigoroso inquérito", sem entrar no mérito da questão: o de dar poder de polícia a pessoas despreparadas, para quem a agressão é um ato normal e que deve ser aceito como um fato da vida.



E eu com isso?

Sabe aquela tela sensível ao toque, que a Globo está usando? Pois está cada vez mais popular: no Iphone, em marcas concorrentes, em notebooks. Um fabricante de celulares desenvolveu uma tela dessas de vidro temperado, à prova de manchas e riscos. Uma beleza! E, com a convergência digital, cada vez mais teremos informações em celulares e notebooks com telas sensíveis ao toque – ou, como preferem os vendedores, em touch screen. Basta passar o dedo na tela e saberemos, imediatamente, que:

** "Madonna esnoba Gianecchini e dá atenção para Santoro em festa"

** "Scarlett Johansson assoa o nariz e lenço vai a leilão"

** "Pet shop freqüentado por Britney e Paris pode fechar"

** "Tom Cruise não vai ao aniversário da mulher nos EUA"



O grande título

Dias de festas, dias de plantão, meia equipe de folga, sabe como é. E os títulos mostram direitinho o que está acontecendo nos meios de comunicação:

** "Correa diz não cair em canto das sereiais para pagar dívida"

Correa é Rafael Correa, presidente do Equador. Sereiais deve ser "sereias" digitado às pressas, sem revisão. Ou é algum prato que leva cereais, igualmente com problemas de digitação. Não faz muita diferença: cereais não cantam, sereias não existem, Rafael Correa não diz coisa com coisa.

** "Rede de fast food lança desodorante de carne assada"

Deve haver quem entenda. Mas, se o título exprimir o que diz a matéria, que coisa sensacional! Este colunista acha que desodorante de carne assada vai afastar todos os amigos. Em compensação, atrairá todos os cachorros da rua.

E agora, o melhor título:

** "Veja os bebês de famosos que nasceram em 2008"

Eta, gente precoce!

Cachorras se apaixonam por novo desodorante


Rede de fast food lança desodorante de carne assada

Uma rede de fast food americana lançou um desodorante com aroma de carne assada, informou o Yahoo News nesta quinta-feira. O produto, desenvolvido para homens, é chamado de Flame.

» Excesso de desodorante ativa alarme
» China cria selos com gosto de porco
» Japão cria alarme feito de tempero

De acordo com o Burguer King, fabricante do produto, o cheiro pode ser descrito como "a sedução com um toque de carne assada". A essência seria parecida com o sanduíche mais famoso da rede, o Whopper.

No site que promove o novo produto, o mascote da rede aparece nu, com o desodorante à frente.

Redação Terra

Fotoconcurso


Concurso premia fotografias inéditas

Do Coletiva.Net

Estão abertas até 10/3/2009 as inscrições do Prêmio FCW de Arte 2008, promovido anualmente pela Fundação Conrado Wessel. Os fotógrafos profissionais interessados podem concorrer em duas categorias: Fotografia Publicitária e Ensaio Fotográfico, e os vencedores dividirão prêmios que totalizam R$ 284 mil, incluídos os encargos fiscais. A principal novidade desta sétima edição da promoção está na categoria Ensaio Fotográfico que, além de trabalhos publicados em mídia impressa, também premiará imagens inéditas. Nos dois casos, os ensaios deverão contemplar um conjunto de cinco a 10 imagens sobre o tema “Brasil: a questão socioambiental”, e ter sido publicados ou produzidos no período entre janeiro de 2006 e 15 de dezembro de 2008, com abordagens que tenham a natureza e a relação do ser humano com o seu meio. As premiações na categoria Ensaio Fotográfico serão de R$ 114 mil (primeiro lugar) e R$ 28 mil (segundo colocado). O autor do melhor Ensaio Fotográfico Inédito também receberá R$ 28 mil. A ficha de inscrição e o regulamento completo para o Prêmio FCW de Arte estão disponíveis no site da Fundação (www.fcw.org.br).

sábado, 20 de dezembro de 2008

O ignorante alegre

Globo defende nova modalidade para entrevista: a mata-cobra-pongue





Explicação da Central Globo de Comunicação: "O repórter Márcio Canuto é conhecido pela informalidade em suas reportagens. A TV Globo entende que o repórter em nenhum momento ofendeu ou usou de violência".

Para a CGCom, tapa na cara DOS OUTROS não dói.

Cantemos então para a Rede Globo:

Vai Glamurosa
Cruze os braços no ombrinho
Lança ele prá frente
E desce bem devagarinho...

Dá uma quebradinha
E sobe devagar
Se te bota maluquinha
Um tapinha eu vou te dar
Porque:

Dói, um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Só um tapinha...(2x)

Vai Glamurosa
Cruze os braços no ombrinho
Lança ele pra frente
E desce bem devagarinho...

Dá uma quebradinha
E sobe devagar
Se te bota maluquinha
Um tapinha eu vou te dar
Porque:

Dói, um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Só um tapinha
Dói, um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Um tapinha não dói...

Em seu cabelo vou tocar
Sua boca vou beijar
Tô visando tua bundinha
Maluquinho pra apertar...(2x)

Vai Glamurosa
Cruze os braços no ombrinho
Lança ele pra frente
E desce bem devagarinho...

Dá uma quebradinha
E sobe devagar
Se te bota maluquinha
Um tapinha eu vou te dar
Porque:

Dói, um tapinha
Dói, Dói, Dói, Dói
Dói, um tapinha
Dói, Dói, Dói, Dói
Dói, Dói, Dói, Dói
Dói, Dói, Dói, Dói...

Dói, um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Só um tapinha
Dói, um tapinha não dói
Um tapinha não dói
Um tapinha não dói...

Vai Glamurosa
Cruze os braços no ombrinho...(3x)

Lança ele pra frente
E desce bem devagarinho...

Dá uma quebradinha
Dá uma quebradinha
Dá uma quebradinha
E sobe devagar
Se te bota maluquinha
Um tapinha eu vou te dar
Porque: Só um tapinha!...

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Duas vagas para lecionar jornalismo no Centro Universitário Metodista/IPA em Porto Alegre



EDITAL Nº 142/2008
Gestão de Pessoas e a Pró-Reitoria de Graduação do Centro Universitário Metodista, do
IPA, no uso de suas atribuições, torna público o PROCESSO SELETIVO DE DOCENTES para
contratação e cadastro reserva para o primeiro semestre de 2009.

I – DA INSCRIÇÃO

1.1 As inscrições devem ser realizadas pessoalmente de 17 a 23 dezembro de 2008,
com a entrega de cópia do currículo lattes e com o preenchimento da ficha de protocolo, segundo
informações abaixo:

Horário: das 8:00 às 17:30.
Local: Unidade Americano, do Centro Universitário Metodista, do IPA, no setor de Gestão de
Pessoas, situado na rua Dr. Lauro de Oliveira, 119. Bairro Rio Branco, Porto Alegre – RS. Para os
currículos enviados via correio, deve-se imprimir a ficha de protocolo de inscrição (anexo 1),
preenchê-la e enviá-la junto com o currículo para o setor de Gestão de Pessoas no
endereço citado acima. Só serão validados os currículos postados até a data de
encerramento do edital.

Centro Universitário Metodista IPA
Rua Cel. Joaquim Pedro Salgado, 80
Rio Branco
CEP 90420-060
Porto Alegre - RS
Fones: (51) 3316.1100
www.metodistadosul.edu.br

Jornalismo 02
Vaga 1: O papel do jornalismo
especializado na sociedade
contemporânea
Vaga 2: Processos de produção de
jornais e revistas. Técnicas e
ferramentas básicas e
intermediárias de construção de
hipermídia.
Vaga 1: Conhecimento teórico e prático do fazer do Jornalismo investigativo.
Titulação mínima: Especialista
Vaga 2: Conhecimento de novas tecnologias e os seus impactos sobre a profissão de
Jornalismo. Conhecimento teórico e prático da produção de jornais e revistas.
Titulação mínima: Especialista






O dia em que o tira-gosto foi um grito

Moacir Japiassu (*)

Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.

(Affonso Romano de Sant'Anna in A implosão da mentira)

O dia em que o tira-gosto foi um grito
Manchete da Folha Online:

Oito em cada dez brasileiros nunca ouviram falar do AI-5

Como era sábado, 13/12, dia de razoável folga aqui no sítio, Janistraquis abandonou o computador e saiu para tomar uma cachaça acompanhado do colunista.

"Considerado, o tira-gosto vai ser um grito", avisou ele.

Então, entornamos uma garrafa inteira, presente do José Alberto da Fonseca, e a cada gole gritávamos ao vento:

"C..................ARAAAAALHOOOOO!!!!"

Oito em cada dez brasileiros nunca ouviram falar do AI-5. O presidente-preferência-nacional tem razão: só bebendo, e bebendo muito, é possível suportar o país de m... em que vivemos.

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A Implosão da mentira
Leia aqui a íntegra do excepcional e histórico poema cujo excerto encima a coluna. Se ninguém lhe revelasse o ano da luz (1980), muitos o teriam por composto hoje de manhã. “Não se chega à verdade pela mentira, nem à democracia pela ditadura”, diz outro de seus versos.

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Causa mortis
Janistraquis, que de vez em quando dá uma olhada em A Favorita, me avisou lá do escritório:

“Considerado, o Instituto Médico Legal acaba de divulgar o laudo cadavérico do Doutor Gonçalo! Tá escrito aqui: causa mortis, burrice.”

O patriarca da família Fontini fora, aparentemente, vítima das artes de Flora, a vilã-super-hiper da novela; porém, se o IML diz que o homem morreu de burrice não somos nós que vamos contrariar os legistas

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Coronel Lula
Veterano e honesto político nordestino (os há, os há), amigo do colunista há mais de 40 anos, escreve para dizer que, com os mais de 80% de aprovação naquelas bandas, o presidente já pode, pelo menos moralmente, fazer parte daquelas oligarquias que criaram a Guarda Nacional e se transformar, definitivamente, em Coronel Lula, senhor do mais vasto curral eleitoral da história política do Brasil.

Falou-se em coronel e Janistraquis recordou imediatamente o mais famoso deles, Chico Heráclio do Rêgo, de Limoeiro, sertão de Pernambuco. Na orelha do excelente livro escrito pelo sobrinho-neto do coronel, André Heráclio do Rêgo, intitulado Família e Coronelismo no Brasil e editado pela Girafa, escreveu o jornalista, poeta e romancista José Nêumanne Pinto:

Um dos clássicos do folclore político nacional selecionado pelo jornalista
baiano Sebastião Nery é o causo, segundo ele verídico, protagonizado
pelo coronel Chico Heráclio do Rêgo, de Limoeiro, interior de Pernambuco.
À época do episódio, votava-se em cédulas impressas postas pelo eleitor
num envelope que, lacrado e assinado pelos mesários, este depositava na
urna.

0 coronel em questão reuniu seus moradores, mandou que ficassem
em fila indiana e lhes entregou, um a um os envelopes lacrados com
as cédulas dos candidatos sufragados. Aí era só ir à seção eleitoral, pegar as
assinaturas dos mesários e votar.

Votar? Pois é! Um cabra mais ousado resolveu perguntar: "0 senhor pode
me dizer pelo menos em quem eu vou votar, coronel?" A resposta foi ríspida e rápida: "Então, cabra ignorante, tu não sabes que o voto é secreto?"

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Nahum Sirotsky
O considerado Camilo Viana, um dos mais antigos e queridos amigos de Nahum Sirotsky, criador daquela fantástica Senhor do início dos anos 60, envia perfil desse jornalista histórico, publicado na revista Imprensa. À mensagem com a matéria anexada, Camilo acrescentou esta frase: “Conheces Nahum? És um privilegiado.”

O colunista é um dos privilegiados, pois também cultiva a amizade de Nahum há mais de 40 anos e com ele teve a honra de trabalhar no Jornal do Brasil. Leia aqui a íntegra do texto que revela aos jovens um extraordinário profissional, desses que não existem mais.

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Excesso, não!
Sob o título Livre escolha -- Para chefe do MP-SP, promotor pode usar arma que quiser, Janistraquis leu no indispensável Consultor Jurídico:

(...) figura como réu o promotor Pedro Baracat Guimarães Pereira, acusado de matar com 10 tiros o motoqueiro Firmino Barbosa. Os disparos saíram de uma pistola calibre 9 milímetros, de uso restrito. Segundo Pereira, em legítima defesa. Grella denunciou Baracat apenas por excesso de legítima defesa, e não por porte de arma de uso restrito.

Fiquei impressionado com o tal “excesso de legítima defesa”, pois sempre pensei que fosse impossível medir-se uma reação instantânea e involuntária, porém meu assistente interpretou a curiosa expressão:

“Considerado, excesso de legítima defesa só acontece quando, ao reagir a uma agressão, você dá 10 tiros na cara do agressor que merecia simplesmente um pontapé na bunda.”

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Ceilândia
O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no Planalto, de cujo varandão debruçado sobre o aperreamento é inevitável escutar ecos dos sempre insuportáveis discursos do presidente-preferência-nacional, pois Roldão encarou o computador e escreveu esta mensagem à direção do Correio Braziliense:

A legenda da foto do "ISTO É BRASÍLIA" deste domingo explica a origem do nome Ceilândia e diz que o sufixo "land" é de origem norte-americana. Gostaria de lembrar que a língua dos EUA é o inglês e, portanto, o sufixo é de origem inglesa.

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Sapataria
O considerado José Truda Júnior, que gastou muitos solados nessa caminhada pela vida afora, pondera os últimos acontecimentos internacionais e despacha de seu minarete de Santa Teresa:

É de doer o jeito com que as autoridades tratam os jornalistas credenciados a entrevistar presidentes americanos em visita-surpresa ao Iraque. O jornalista Muntadhar al-Zeidi, que teve um braço quebrado, levou uma coronhada na nuca e quase ficou caolho que o diga. Mas a pergunta que não quer calar é:

- Quem ficou com os sapatos voadores?

A essa altura, cada pé deve valer mais do que uma sapataria inteira!

Segundo informa Janistraquis, já apareceu um xeique para oferecer dez milhões de dólares pelos famosos mocassins. É muito mais do que uma sapataria inteira.

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Período fértil
Estimulante chamadinha na capa do UOL:

Mulheres em período fértil são mais propensas a dar o telefone

Janistraquis leu, pensou um pouco e ejaculou:

“Engraçado, considerado, sempre pensei que as mulheres em período fértil dessem outra coisa...”

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Joaquins
Deu no Erramos da Folha de S. Paulo:

OPINIÃO (8.DEZ, PÁG. A3) O nome completo do escritor Machado de Assis é Joaquim Maria Machado de Assis, e não Joaquim Aurélio Machado de Assis, como estava no artigo "Machado, cultura e política".

Recordei logo aquele erramos de Janistraquis, no tempo em que era editor de jornal em Caruaru:

"Joaquim José da Silva Xavier não é o Duque de Caxias."

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Desgraça Para Todos
Por força de ignorância tsunâmica, somente agora, no aniversário de 40 anos daquele lixo que se abateu sobre a nação, o colunista ficou sabendo que existe em Brasília uma ponte chamada Costa e Silva; estranhei a “homenagem” àquela alimária, porém Janistraquis achou-a normal e justa:

“Considerado, não se pode esquecer que Costa e Silva construiu a ponte entre a falsa democracia de Castelo Branco e a ditadura explícita que se seguiu, à qual devemos o prelúdio do golberismo acadêmico e do lulismo de curso primário.”

Diante disso, cheguei à conclusão de que uma ponte é muito pouco, é quase nada diante da formidável sucessão de desgraças.

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Nota dez
O considerado Mestre Mauro Santayana escreveu no Jornal do Brasil:

Para muitos dos que vivem no resto do país, a Amazônia parece tão distante quanto os desertos africanos. Os brasileiros de modo geral não recebem informações suficientes sobre a região. Para o Brasil é uma questão de honra a plena soberania sobre a totalidade de seu território.

(...) Os madeireiros e garimpeiros, muitos associados a espertíssimos índios e a compradores estrangeiros, hoje devastam a floresta e poluem suas águas. As organizações não-governamentais, quando não se encontram diretamente subordinadas aos financiadores estrangeiros, quase sempre são grupos de parasitas, que vivem de dinheiro público. Neste mesmo espaço comentamos, há alguns meses, que só os índios da Amazônia despertam os corações e mentes dessas ONGs: os indígenas de Mato Grosso do Sul, quando não se suicidam, morrem de doenças banais e de desnutrição, sem que esses abnegados filantropos ali apareçam.

Leia no Blogstraquis a íntegra do artigo que aponta e ilumina o caminho das pedras.

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Errei, sim!
FUNDO PERDIDO -- Deu no jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte, debaixo do título Estado repassa verbas para assentar famílias: "(...) Não foi estipulado pela prefeitura de Neves o prazo para assentamento
definitivo das famílias. O prefeito informou que viaja hoje para Brasília em busca de um fundo perdido no Ministério da Ação Social, verba que, se encontrada, será usada para compra de material".

Segundo meu secretário Janistraquis, recém-promovido a assistente, hoje em dia não se faz jornalismo como dantes, quando qualquer repórter sabia que uma verba a fundo perdido não está, obrigatoriamente, escondida, esquecida, abandonada. (janeiro de 1995)

Colaborem com a coluna, que é atualizada às quintas-feiras: Caixa Postal 067 – CEP 12530-970, Cunha (SP), ou japi.coluna@gmail.com.

(*) Paraibano, 66 anos de idade e 46 de profissão, é jornalista, escritor e torcedor do Vasco. Trabalhou, entre outros, no Correio de Minas, Última Hora, Jornal do Brasil, Pais&Filhos, Jornal da Tarde, Istoé, Veja, Placar, Elle. E foi editor-chefe do Fantástico. Criou os prêmios Líbero Badaró e Claudio Abramo. Também escreveu nove livros (dos quais três romances) e o mais recente é a seleção de crônicas intitulada “Carta a Uma Paixão Definitiva”.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Interrogatório

À cata dos trainees acadêmicos


OPORTUNIDADE NO CANADÁ:

PROGRAMA SAUVÉ SCHOLARS

Inscrições até 31 de dezembro de 2008

A Fundação Jeanne Sauvé informa que encerram-se em 31/12/2008 as inscrições para o Programa Sauvé Scholars, biênio 2009-2010. Este programa é uma oportunidade única para 12-14 jovens líderes de todo o mundo, com até 30 anos de idade, que poderão vivenciar o ano acadêmico em Montreal, no Canadá, para um período de pesquisa, reflexão e desenvolvimento pessoal e profissional. Um aspecto singular do programa é que todos os participantes do programa residem em uma mansão histórica, localizada próximo à Universidade McGill, que será seu lar acadêmico.

Os estudantes adquirem o status de "Trainees Acadêmicos", e consequentemente desfrutam de acesso integral a todos os cursos (mas não para créditos) e instalações da Escola de Pós-Graduação da Universidade McGill, incluindo
bibliotecas e salas de aulas. Somado a isso, cada estudante tem um Mentor Acadêmico para ajudá-lo na escolha dos cursos na Universidade e, quando necessário, dar aconselhamento para estudos futuros e a carreira profissional, orientando os estudantes também sobre outros serviços na Universidade ou na cidade de Montreal que sejam de seu interesse. Além
disso, os conselheiros compartilham suas experiências, ajudando os estudantes a expandir suas habilidades de compreensão e amadurecimento.

Ademais, os estudantes gozam de um programa privado enriquecedor composto de seminários com jornalistas eminentes, personalidades políticas e líderes nas áreas de negócios, governo, filantropia, artes, entre outras. Esse período no Canadá, que é de nove meses, provou ser gratificante para aqueles que já participaram e para a comunidade em geral. Nos seus seis anos de existência, o Programa Sauvé Scholars acolheu 74 participantes de 39 países, incluindo 12 do Canadá. Esses jovens são escolhidos, principalmente, segundo critério instituído pela Senhora Sauvé, que envolve iniciativa, motivação, visão, imaginação, retórica apurada, ciência de assuntos nacionais e internacionais, e um forte desejo de promover mudanças.

Maiores informações podem ser encontradas no sítio www.sauvescholars.org, onde os interessados podem se candidatar online e/ou baixar os formulários de candidatura.

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Apoio na divulgação: Assessoria para Assuntos de Educação e de Diplomacia Pública da Embaixada do Canadá

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Circo da Notícia



AI-5, QUARENTA ANOS
A história eu conto como a história foi

Por Carlos Brickmann - Observatório da Imprensa

Manhã do dia 13 de dezembro de 1968. Os primeiros jornalistas do Jornal da Tarde chegam à Redação e são surpreendidos com uma notícia inacreditável: o Estadão, o invulnerável Estadão, o poderoso diário O Estado de S.Paulo, tinha sido proibido de circular por ordem da Polícia Federal. Indignação: só dois policiais tinham ido às oficinas e, embora em absoluta inferioridade numérica, haviam sido obedecidos.

Lembremos o clima da época: ao contrário das lendas hoje circulantes, a ditadura começou mesmo, com força, com o Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968. Até então houvera atos violentos, mas esporádicos; houvera tortura, mas não ainda como prática sistemática; houvera atos bárbaros, como a prisão do líder comunista Gregório Bezerra; houvera prisões, mas nada como o que ocorreria mais tarde. Ainda havia espaço para manifestações políticas. O que caracterizava aquilo que, na época, se chamava "ditamole", era a impossibilidade de escolher o presidente da República e os governadores. Quem escolhia eram os militares e seus aliados – e pronto.

Quando o Jornal da Tarde, já no meio da manhã, começou a sair das rotativas, apareceram outros dois policiais federais e informaram que a distribuição estava proibida. Vários jornalistas desceram à rua para conversar com eles: este colunista, Ewaldo Dantas Ferreira, Guilherme Miranda, Décio Pedroso, Fernando Morais, Rolf Kuntz, Fernando Portela, Mário Lima, Anélio Barreto, Sandro Vaia, Moisés Rabinovici, o hoje ministro Miguel Jorge, muitos colegas – como lembrar todos? O diálogo foi inútil. Em dado momento, um jornalista se irritou: "Quantos de vocês estão aqui?" A resposta: "Nós dois". Tréplica: "Então saiam da frente que os caminhões vão sair. Quando chegar mais gente vocês façam o que quiserem".

O JT começou a circular. Algum companheiro, mais esperto (nunca soube quem foi), articulou a manobra seguinte: reativar a saída da madrugada, que era usada pelo Estadão, dobrando a esquina, em que os caminhões paravam e os fardos de jornais já caíam na caçamba. Quando chegaram os reforços da Polícia Federal para interditar o jornal, foi só mudar a saída. Passava gente pela rua e, vendo a aglomeração, queria saber o que estava acontecendo. A gente informava: estão proibindo o jornal de circular. As pessoas não acreditavam: "Como, se está saindo do outro lado?" Aí o transeunte era chamado de lado e ficava sabendo da história. Todos saíam rindo.

Enfim, não podia durar muito. A Polícia Federal acabou descobrindo o truque e mandou dezenas de carros de banca em banca, para apreender o que já tinha sido distribuído. Os jornaleiros acharam jeito de esconder alguns exemplares para os clientes fiéis. Essa meia-vitória que foi uma meia-derrota foi o último ato de liberdade de imprensa em muitos anos. Ela só voltaria, no caso da S/A O Estado de S. Paulo, no dia do centenário da empresa, em 4 de janeiro de 1975.

Foi um movimento espontâneo de jornalistas, sem nada combinado, sem chefia, sem consulta ao comando da empresa. Talvez por isso, o caro colega pode procurar o registro desse fato em qualquer história do período. Como não houve envolvimento patronal, o registro simplesmente não existe.


Plágio

O título da coluna lhe parece familiar? É: foi praticamente copiado do livro de Paulo Cavalcanti, O caso eu conto como o caso foi (Editora Guararapes, 1980). Para que forçar a cabeça quando um título tão bom já foi criado?


Destino

Fernando Portela, jornalista de boa memória, lembra que Fernando Morais, preso outro dia no aeroporto de Madri por ter sido confundido com um traficante português, é reincidente. Há alguns anos, foi fazer uma reportagem no interior do Maranhão, acompanhado pelo fotógrafo Alfredo Rizzuti, e os dois acabaram presos pelo Exército, acusados de terroristas. Mais tarde, soube-se o motivo: os militares achavam que eram guerrilheiros do Araguaia tentando ampliar o movimento – do qual não havia ainda notícia no resto do país.

Cá entre nós, dava mesmo para desconfiar: o hoje nédio Fernando Morais, a prosperidade estampada na barba bem feita e nas boas roupas que certamente é sua mulher que escolhe, na época era um pouco diferente. Usava cabelo comprido, aquela barba de mineiro, ralinha!, e roupa cáqui. Quando viram que era só o jeitão, soltaram. "Ser confundido com outro e preso deve ser carma dele", explica Portela.


O horror, o horror

Adib Muanis, o excelente chefe de reportagem da TV-TEM de Rio Preto, SP, manda um bilhete que precisa ser transcrito:

"Escrevo porque estou em dúvida: o mau gosto venceu? A estupidez venceu? Perdemos a noção do ridículo, do mórbido? Optamos pelo mundo cão?

"Estas perguntas têm por base a seguinte proposta feita por um portal da Internet – um portal de notícias:

"Retrospectiva. Morte de Isabella ou Seqüestro de Eloá. Vote no crime do ano."

"Como assim? Vamos eleger o Crime do Ano usando quais critérios? Vamos ver o que é mais cruel: manter uma moça seqüestrada por cem horas e depois atirar contra ela? Ou atirar uma menina de cinco anos pela janela?

"Francamente..."

Muanis, no meio do furacão que é dirigir a reportagem de uma emissora de TV, mantém a lucidez, a dignidade, a capacidade de pensar. Talvez os pouca-práticas que bolaram o concurso não tenham pensado no que fizeram. Mas há editores; os portais têm direção, têm superintendência, têm donos. E ninguém se mexe? Repetindo o que disse Adib Muanis, francamente...


O seu, o meu, o nosso

A imprensa deixou passar praticamente em branco (com exceção de um ou outro blog, que tratou do assunto de maneira rápida) uma história que mereceria ser bem contada: o patrocínio da Eletrobrás, R$ 14 milhões anuais, ao Clube de Regatas Vasco da Gama, do Rio. Há dois motivos para discutir o assunto:

1. O Flamengo, que esteve entre os clubes que disputaram o título de campeão brasileiro, recebe apenas um pouco mais de sua patrocinadora, a Petrobras: R$ 16 milhões. O Vasco, com grande tradição e torcida, acaba de ser rebaixado.

2. A Petrobras, que patrocina o Flamengo, disputa o mercado de combustíveis e lubrificantes com grandes empresas nacionais e multinacionais há muitos anos na praça, como Shell, Ipiranga, Esso. Precisa, portanto, anunciar. A Eletrobrás não disputa mercado. Quem vende energia são empresas a ela subordinadas, mas que não utilizam sua marca. A Eletrobrás não tem qualquer motivo para anunciar seu produto – aliás, que produto? E com o seu, o meu, o nosso dinheiro?

É um bom tema. O ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, que cuida de Petrobras e Eletrobrás, poderia explicar por que o Flamengo, que disputou o título e tem torcida maior, ganha só um pouquinho mais do que o rebaixado Vasco.


As manias

Houve época, nos meios de comunicação, em que a palavra "vender" foi abolida: o termo era "comercializar". E ninguém punha preço nas coisas, nem cobrava: ele "praticava" preços, "praticava" juros. Houve época, também, em que repetir palavras era crime inafiançável. Tombava um caminhão de bananas e "as musáceas" ficavam espalhadas pela rua. Café era "rubiácea". Soja, "leguminosa". E amendoim, "papilionácea". Jogo duro, companheiros.

Hoje a palavra proibida, lembra a ótima jornalista Regina Helena Teixeira Alonso, é "fazer". As pessoas não fazem mais nada: só realizam. "Os estudantes vão realizar a prova no domingo". Fazer a prova, jamais. O técnico "vai realizar o treino pela manhã". "As pessoas estão realizando as compras de Natal". Fazer compras? Que coisa mais antiquada!

É como "tomar medidas", também fora de moda. Em todos os meios de comunicação, as medidas são "implementadas" – desde que, naturalmente, o governo "disponibilize" recursos. O publicitário Ricardo Freire, que escreve colunas deliciosas, jura que não aceita nada que lhe seja "disponibilizado". Tem razão. E, se a empresa "vai estar disponibilizando", então fuja depressa!


Como...

Título de um grande portal noticioso:

** "Incêndio em prédio no Maracanã faz duas vítimas"

Texto: "(...) o acidente teria acontecido no segundo andar, matando duas pessoas: uma mulher e seu sogro (...) nenhuma pessoa ficou ferida gravemente".

Tudo bem: quem morreu, morreu. Quem não morreu, ficou ferido levemente.

...é...

Também de um grande portal noticioso:

** "Ator holandês morre após recorrer à eutanásia"

Eutanásia, ou "boa morte", é a abreviação da vida de quem está sofrendo. As pessoas que recorrem à eutanásia costumam mesmo vir a falecer.

...mesmo?

A informação é de uma grande revista econômica internacional, que já teve até edição no Brasil:

** "Suri Cruise é a criança mais influente do mundo"

Suri é filha de Tom Cruise e Katie Holmes. Sua idade: dois anos.

Mas essas coisas podem acontecer. Há alguns anos, conta-se, o governador de um importante estado brasileiro era totalmente dominado pela esposa. A esposa, por sua vez, fazia tudo o que seu decorador mandava. O decorador tinha um namorado, a quem deu casa, carro, dinheiro e carinho, conhecido pelo carinhoso apelido de Gasolina.

E Gasolina, analfabeto de pai e mãe, em última análise era quem mandava no estado. Por que não uma menina de dois anos, que também deve ser analfabeta?


E eu com isso?

Um jornalista de longa carreira e profundamente especializado, Ethevaldo Siqueira, nos traz continuamente as últimas novidades em telecomunicações. Equipes de técnicos competentes e dedicados mantêm os computadores das redações funcionando corretamente. Os provedores investem, a banda larga fica a cada dia mais rápida (se bem que ainda oscilante e caríssima), especialistas definem as ondas em que opera cada tipo de equipamento e procuram regulamentar a convergência tecnológica, em que os clientes podem telefonar pelo computador, assistir a programas de TV pelo telefone, mandar e-mails por aparelhos de videogame – fantástico.

É graças a isso que temos notícias como essas no momento em que ocorrem – na linguagem de hoje, online, em real time:

** "Hernanes vai a prêmio de chapéu"

** "Nicole Kidman se exercita em Londres"

** "Kate Moss vai às compras carregando bichinho de pelúcia"

** "Nome do filho de Ashlee Simpson é eleito o mais feio"

Este colunista se lembra do grande Capitão, volante eficiente, bom marcador, que jogou até avançada idade na Portuguesa de Desportos. Capitão se chama "Oliúde". E seu filho, "Oliúde Jr." Será que o filho de Ashlee Simpson é páreo?


O grande título

Para este colunista, o melhor título é o de Clara Ant, uma das principais auxiliares do presidente Lula. Como a burocracia odeia coisas simples, Clara Ant (ela própria uma pessoa descomplicada, sem frescuras) é "chefe do Gabinete-Adjunto de Informações em Apoio à Decisão do Gabinete Pessoal do Presidente da República".

Mas o espírito da busca do grande título é outro. E há um imbatível:

** "Polícia suspeito de `roubar o próprio carro´"

Deve ser coisa importante. Se a gente entender, então, melhora muito!

domingo, 14 de dezembro de 2008

A dentista


Como Brasília perdeu uma prostituta

Gilberto Dimenstein - para o www.catracalivre.com.br

Como era inteligente, a menina prosperava cada vez mais rápido na escola; assim, deixou a prostituição e virou dentista

A educadora Dagmar Garroux preparou uma de suas alunas para ser prostituta. Mas não qualquer prostituta -seria treinada para circular pelos bastidores de Brasília. Além de etiqueta, aprenderia a falar bem português e se viraria no inglês ou espanhol. Com aulas de artes, história e atualidades, ela conseguiria manter uma conversa em recepções. “O treino funcionou”, orgulha-se Dagmar. Funcionou tão bem que Brasília perdeu uma prostituta.

A menina, estimulada com a chance de ser prostituta em Brasília, morava na favela do Parque Santo Antônio, localizada no chamado “triângulo da morte”, na zona sul da cidade de São Paulo. No “triângulo” existe o cemitério São Luiz, que, conta-se, é o lugar onde estariam enterrados mais adolescentes por metro quadrado no mundo.

Dagmar criou, ali, um centro educacional batizado de Casa do Zezinho -o nome é inspirado na poesia “E agora, José?”, de Carlos Drummond de Andrade. Uma das freqüentadoras da casa era a menina, que começou a vender o corpo, na fronteira da adolescência, agenciada por um rapaz mais velho da escola pública em que estudava. Dividiam pela metade o valor de cada programa (R$ 10).

A garota não gostou da intromissão da educadora. “Não se mete, não.
Você nunca pensou em se vender para ganhar dinheiro?”, perguntou, agressiva. Ela era conhecida pela violência, metia-se em brigas. Quase sempre andava com uma faca.

Dagmar suspeitou de que corria o risco de perder a aluna, desfeito o já frágil laço afetivo. Decidiu entrar no jogo. Disse que nunca quis vender o corpo. Mas, se quisesse, não iria aceitar mixaria. “Eu iria cobrar no mínimo R$ 1.000. Isso no começo, depois aumentaria o preço.”

A aluna arregalou os olhos e ouviu a improvável proposta: “Por que você não se prepara para ser puta em Brasília? Você ganha dinheiro e se aposenta”. Com aquele corpo e a bagagem intelectual, acrescentou, certamente iria surgir um marido rico.

No dia seguinte, a garota voltou, animada com a proposta. “Topo”, disse. Dagmar ponderou que ela deveria, então, se preparar. Para começo de conversa, deveria se cuidar para que aumentasse a disputa dos clientes.

Precisaria, assim, parar imediatamente de estragar seu corpo com os homens da favela. “Você quer chegar a Brasília com a mercadoria velha?” Dagmar convenceu-a de que, além do corpo atraente, precisaria mostrar cultura e saber falar. Um tanto a contragosto, mas de olho nas recompensas futuras, aceitou as aulas.

Com as aulas, vieram reflexões sobre autonomia e responsabilidade; a auto-estima era trabalhada em projetos de arte e comunicação. Certo dia, ela fez um comentário sobre os dentes de Dagmar. “Parece que você tem uma boca de cavalo.” E brincou: “Se eu fosse dentista, eu consertaria a sua boca”.

O apoio explicou por que, embora sem intenção, a menina apresentasse melhor desempenho escolar. A trajetória teve momentos de crise: como já não faturava com a prostituição, a garota passou a vender drogas. Dagmar voltou a argumentar que, se fosse mesmo vender drogas, deveria se tornar chefe e, aí, precisaria continuar os estudos para entender contabilidade. O inglês seria útil para transações internacionais.

Como era inteligente, a menina prosperava cada vez mais rapidamente na escola. À medida que ficava mais velha, prestava mais atenção no que acontecia em sua comunidade com quem se envolvia com as drogas e a prostituição -bem ao seu lado estava o pedagógico cemitério São Luiz.

Ela chegou a concluir o ensino médio e suspeitou que talvez pudesse prosseguir. Por motivos óbvios, não posso revelar o nome da aluna: “Ainda sinto muita vergonha”, justifica. Fez um cursinho pré-vestibular gratuito e entrou na USP. Formou-se em odontologia -e agora vive consertando bocas.

PS: A ex-futura-prostituta de Brasília é um dos casos que passaram pela Casa do Zezinho, uma experiência relatada agora pelo educador Celso Antunes no livro “A Pedagogia do Cuidado”, a ser lançado neste mês.

Ele detalha o que existe de teorias pedagógicas por trás dos exemplos.
Se os gestores municipais agora eleitos quiserem fazer cidades melhores, terão de aprender as magias que podem ser feitas quando existirem bons educadores, mesmo num “triângulo da morte”.

É mais uma ilustração do que sempre digo: educar é ensinar o encanto da possibilidade. Um dos seus projetos é transformar aquele simbólico cemitério São Luiz, com o recorde de covas de adolescentes, numa galeria de arte, com os muros externos pintados -as obras, claro, serão feitas por adolescentes. Por esse tipo de experiência, Dagmar vai dar aula, na próxima semana, num curso de gestão da Fundação Vanzolini, da Poli.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Com praga rogada pela Ana Maria Braga

não se brinca

O epílogo

CAPÍTULO CXLV / O REGRESSO

Ora, foi já nesta casa que um dia. estando a vestir-me para almoçar, recebi um cartão com este nome:

EZEQUIEL A. DE SANTIAGO

--A pessoa está aí? perguntei ao criado.

--Sim senhor, ficou esperando.

Não fui logo, logo; fi-lo esperar uns dez ou quinze minutos na sala. Só depois é que me lembrou que cumpria ter certo alvoroço e correr, abraçá-lo, falar-lhe na mãe. A mãe,--creio que ainda não disse que estava morta e enterrada. Estava; lá repousa na velha Suíça. Acabei de vestir-me às pressas. Quando saí do quarto, com ares de pai, um pai entre manso e crespo, metade Dom Casmurro Ao entrar na sala, dei com um rapaz, de costas, mirando o busto de Massinissa, pintado na parede. Vim cauteloso, e não fiz rumor Não obstante, ouviu-me os passos, e voltou-se depressa. Conhece-me pelos retratos e correu para mim. Não me mexi; era nem mas nem menos o meu antigo c jovem companheiro do seminário de José, um pouco mais baixo, menos cheio de corpo e, salvo as cores que eram vivas, o mesmo rosto do meu amigo. Trajava à moderna naturalmente, e as maneiras eram diferentes, mas o aspecto geral reproduzia a pessoa morta. Era o próprio, o exato, o verdadeiro Escobar. Era o meu comborço; era o filho de seu pai. Vestia de luto pela mãe; eu também estava de preto. Sentamo-nos.

--Papai não faz diferença dos últimos retratos, disse-me ele

A voz era a mesma de Escobar, o sotaque era afrancesado. Expliquei-lhe que realmente pouco diferia do que era, e comecei um interrogatório para ter menos que falar e dominar assim a minha emoção. Mas isto mesmo dava animação à cara dele, e o meu colega do seminário ia ressurgindo cada vez mais do cemitério. Ei-lo aqui. diante de mim, com igual riso e maior respeito; total, o mesmo obséquio e a mesma graça. Ansiava por ver-me. A mãe falava muito em mim, louvando-me extraordinariamente, como o homem mais puro do mundo, o mais digno de ser querido.

-- Morreu bonita, concluiu.

--Vamos almoçar.

Se pensas que o almoço foi amargo, enganas-te. Teve seus minutos de aborrecimento, é verdade; a princípio doeu-me que Ezequiel não fosse realmente meu filho, que me não completasse e continuasse. Se o rapaz tem saído à mãe, eu acabava crendo tudo, tanto mais facilmente quando que ele parecia haver-me deixado na véspera evocava a meninice, cenas e palavras, a ida para o colégio...

--Papai ainda se lembra quando me levou para o colégio? perguntou rindo.

--Pois não hei de lembrar-me?

--Era na Lapa; eu ia desesperado, e papai não parava, dava-me cada puxão, e eu com as perninhas... Sim, senhor, aceito.

Estendeu o copo ao vinho que eu lhe oferecia, bebeu um gole, e continuou a comer. Escobar comia assim também, com a cara metida no prato. Contou-me a vida na Europa, os estudos, particularmente os de arqueologia, que era a sua paixão. Falava da antiguidade com amor, contava o Egito e os seus milhares de séculos, sem se perder nos algarismos; tinha a cabeça aritmética do pai. Eu, posto que a idéia da paternidade do outro me estivesse já familiar, não

gostava da ressurreição. Às vezes, fechava os olhos para não ver gestos nem nada, mas o diabrete falava e ria, e o defunto falava e ria por ele.

Não havendo remédio senão ficar com ele, fiz-me pai deveras. A idéia de que pudesse ter visto alguma fotografia de Escobar, que Capitu por descuido levasse consigo, não me acudiu, nem se acudisse, persistiria. Ezequiel cria em mim como na mãe. Se fosse vivo José Dias, acharia nele a minha própria pessoa. Prima Justina quis vê-lo, mas estando enferma, pediu-me que o levasse lá. Conhecia aquela parenta. Creio que o desejo de ver Ezequiel era para o fim de verificar no moço o debuxo que porventura houvesse achado no menino. Seria um regalo último; atalhei-o a tempo.

--Está muito mal, disse eu a Ezequiel que queria ir vê-la, qualquer emoção pode trazer-lhe a morte. Iremos vê-la, quando ficar melhor.

Não fomos; a morte levou-a dentro de poucos dias. Ela descansa no Senhor ou como quer que seja. Ezequiel viu-lhe a cara no caixão e não a conheceu, nem podia, tão outra a fizeram os anos e a morte. No caminho para o cemitério, iam-lhe lembrando uma porção de cousas, alguma rua, alguma torre, um trecho de praia, e era todo alegria. Assim acontecia sempre que voltava para casa, ao fim do dia; contava-me as recordações que ia recebendo das ruas e das casas. Admirava-se que muitas destas fossem as mesmas que ele deixara, como se as casas morressem meninas.

Ao cabo de seis meses, Ezequiel falou-me em uma viagem à Grécia, ao Egito, e à Palestina, viagem científica, promessa feita a alguns amigos.

--De que sexo? perguntei rindo.

Sorria vexado, e respondeu-me que as mulheres eram criaturas tão da moda e do dia que nunca haviam de entender uma ruína de trinta séculos. Eram dous colegas da universidade. Prometi-lhe recursos, e dei-lhe logo os primeiros dinheiros precisos. Como disse que uma das conseqüências dos amores furtivos do pai era pagar eu as arqueologias do filho; antes lhe pagasse a lepra... Quando esta idéia me atravessou o cérebro, senti-me tão cruel e perverso que peguei no rapaz e quis apertá-lo ao coração, mas recuei; encarei-o depois, como se faz a um filho de verdade; os olhos que ele me deitou foram ternos e agradecidos.


Capítulo CXLVIII - E bem, e o resto?

Agora, por que é que nenhuma dessas caprichosas me fez esquecer a primeira amada do meu coração? Talvez porque nenhuma tinha os olhos de ressaca, nem os de cigana oblíqua e dissimulada. Mas não é este propriamente o resto do livro. O resto é saber se a Capitu da Praia da Glória já estava dentro da de Mata-cavalos, ou se esta foi mudada naquela por efeito de algum caso incidente. Jesus, filho de Sirach, se soubesse dos meus primeiros ciúmes, dir-me-ia, como no seu cap. IX, vers. I: "Não tenhas ciúmes de tua mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti". Mas eu creio que não, e tu concordarás comigo; se te lembras bem da Capitu menina, hás de reconhecer que uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca.
E bem, qualquer que seja a solução, uma coisa fica, e é a suma das sumas, ou o resto dos restos, a saber, que a minha primeira amiga e o meu maior amigo, tão extremosos ambos e tão queridos também, quis o destino que acabassem juntando-se e enganando-me... A terra lhes seja leve! Vamos à História dos Subúrbios.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O olhar de adeus


Capítulo CXXIII - Olhos de ressaca

Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral. No meio dela, Capitu olhou alguns instantes para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas...
As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa, olhando a furto para a gente que estava na sala. Redobrou de carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o cadáver parece que a retinha também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Ele


Capítulo LXXI - Visita de Escobar

Em casa, tinham já mentido dizendo a minha mãe que eu voltara e estava mudando de roupa.
"A missa das oito já há de ter acabado... Bentinho devia estar de volta... Teria acontecido alguma coisa, mano Cosme?... Mandem ver..." Assim falava ela, de minuto a minuto, mas eu entrei e comigo a tranqüilidade.
Era o dia das boas sensações. Escobar foi visitar-me e saber da saúde de minha mãe. Nunca me visitara até ali, nem as nossas relações estavam já tão estreitas, como vieram a ser depois; mas, sabendo a razão da minha saída, três dias antes, aproveitou o domingo para ir ter comigo e perguntar se continuava o perigo ou não. Quando lhe disse que não, respirou.
— Tive receio, disse ele.
— Os outros souberam?
— Parece que sim: alguns souberam.

Tio Cosme e José Dias gostaram do moço; o agregado disse-lhe que vira uma vez o pai no Rio de Janeiro. Escobar era muito polido; e, conquanto falasse mais do que veio a falar depois, ainda assim não era tanto como os rapazes da nossa idade; naquele dia achei-o um pouco mais expansivo que de costume. Tio Cosme quis que jantasse conosco. Escobar refletiu um instante e acabou dizendo que o correspondente do pai esperava por ele. Eu, lembrando-me das palavras do Gurgel, repeti-as:
— Manda-se lá um preto dizer que o senhor janta aqui, e irá depois.
— Tanto incômodo!
— Incômodo nenhum, interveio tio Cosme.

Escobar aceitou, e jantou. Notei que os movimentos rápidos que tinha e dominava na aula, também os dominava agora, na sala como na mesa. A hora que passou comigo foi de franca amizade. Mostrei-lhe os poucos livros que possuía. Gostou muito do retrato de meu pai; depois de alguns instantes de contemplação, virou-se e disse-me:
— Vê-se que era um coração puro!

Os olhos de Escobar, claros como já disse, eram dulcíssimos; assim os definiu José Dias, depois que ele saiu, e mantenho esta palavra, apesar dos quarenta anos que traz em cima de si. Nisto não houve exageração do agregado. A cara rapada mostrava uma pele alva e lisa. A testa é que era um pouco baixa, vindo a risca do cabelo quase em cima da sobrancelha esquerda; mas tinha sempre a altura necessária para não afrontar as outras feições, nem diminuir a graça delas. Realmente, era interessante de rosto, a boca fina e chocarreira, o nariz curvo e delgado. Tinha o sestro de sacudir o ombro direito, de quando em quando, e veio a perdê-lo, desde que um de nós lho notou, um dia, no seminário; primeiro exemplo que vi de que um homem pode corrigir-se muito bem dos defeitos miúdos.

Nunca deixei de sentir tal ou qual desvanecimento em que os meus amigos agradassem a todos. Em casa, ficaram querendo bem a Escobar; a mesma prima Justina achou que era um moço muito apreciável, apesar... — Apesar de quê? perguntou-lhe José Dias, vendo que ela não acabava a frase. Não teve resposta, nem podia tê-la; prima Justina provavelmente não viu defeito claro ou importante no nosso hóspede; o apesar era uma espécie de ressalva para algum que lhe viesse a descobrir um dia; ou então foi obra de uso velho, que a levou a restringir, onde não achara restrição.

Escobar despediu-se logo depois de jantar; fui levá-lo à porta, onde esperamos a passagem de um ônibus. Disse-me que o armazém do correspondente era na Rua dos Pescadores, e ficava aberto até às nove horas: ele é que se não queria demorar fora. Separamo-nos com muito afeto: ele, de dentro do ônibus, ainda me disse adeus, com a mão. Conservei-me à porta, a ver se, ao longe, ainda olharia para trás, mas não olhou.
— Que amigo é esse tamanho? perguntou alguém de uma janela ao pé.

Não é preciso dizer que era Capitu. São coisas que se adivinham na vida, como nos livros, sejam romances, sejam histórias verdadeiras. Era Capitu, que nos espreitara desde algum tempo, por dentro da veneziana, e agora abrira inteiramente a janela, e aparecera. Viu as nossas despedidas tão rasgadas e afetuosas, e quis saber quem era que me merecia tanto.
— É o Escobar, disse eu indo pôr-me embaixo da janela, a olhar para cima.

Circo da Notícia


TEMPO REAL
O jornal do dia, cedinho, e já velho

Por Carlos Brickmann - OI


Às 6 da tarde, a TV já reprisa os melhores lances da partida. Os blogs esportivos, que acompanharam todo o jogo pela internet, publicam as entrevistas e perspectivas de cada time. No rádio, os comentaristas se revezam (e, em seguida, correm para as mesas-redondas da televisão).

Doze horas mais tarde, depois de uma noite de sono, quando o consumidor de notícias pega o jornal, está lá a manchete: "Corinthians vence e garante o título". Nada além do que todos sabiam desde muito antes de ir dormir.

Não vale apenas para o esporte: valeu para a eleição de Obama, para o terrorismo na Índia, para as eleições municipais no Brasil. É um problema: quantas vezes, ao olhar um jornal, a gente pensa que pegou a edição anterior?

Nos anos gloriosos do Jornal do Brasil, Alberto Dines mandou instalar uma TV na redação. Não, não era para acompanhar as notícias (e, com o barulho que na época havia nas redações, isso nem seria possível): o objetivo era lembrar aos jornalistas que a TV já tinha dado a informação. O jornal deveria aprofundá-la, hierarquizá-la, colocá-la no contexto. Esta continua sendo a função do jornal (e cada vez mais, com a infinidade de informações distribuídas por rádio, TV e internet). Se o jornal não serve para isso, não serve para nada.

Antigamente, informação era rara e cara. Hoje, é abundante e barata; mas só vale a pena se for possível entendê-la, buscar suas causas, prever seus efeitos.

Há inúmeras explicações para a queda de circulação dos jornais (que, no Brasil, chegaram alguns anos atrás a mais de 1 milhão de exemplares aos domingos, e hoje não atingem a metade disso): fala-se no fim das promoções, das ofertas especiais, dos brindes que valiam mais que o valor da compra. Mas deve-se pensar também em outra hipótese: a de que os consumidores de notícias deixem de comprá-los porque se tornaram menos necessários.



As faces da informação

Uma ou outra coluna de jornal fala de blogs; é pouco, considerando que o crescimento da internet é explosivo e atinge boa parte do público dos jornais. E quase não se fala de hoax, a falsa notícia de internet que, exatamente por não ser desmentida, circula livre, difamando reputações e prejudicando muita gente.

Entre as múltiplas mentiras difamatórias espalhadas pela internet, há fotos de uma casa extremamente luxuosa, principesca, de propriedade atribuída a uma personalidade brasileira. É a mesma foto que circula na Europa, só que lá é atribuída a Robert Mugabe, o ditador de Zimbabwe. Há a história de uma fazenda-modelo, com rebanho de primeira linha, que teria sido vendida por um tradicional pecuarista ao filho de um político. O proprietário da fazenda existe e já desmentiu que a tenha negociado – mas esse desmentido não foi encampado por nenhum veículo de comunicação, o que faz com que a mentira continue circulando. Há rumores ridículos a respeito de operações bancárias que não ocorreram, e que levantam dúvidas sobre atitudes do governo.

Por que os meios de comunicação mais responsáveis não podem investigar essas histórias e desmenti-las, quando falsas? Ou, se confirmadas, aprofundar as denúncias e apresentar a história inteira, devidamente documentada? Se os jornais comentam novelas de TV, se as emissoras de rádio comentam os jornais, por que fingir que a internet pertence a um outro mundo, que deve ser ignorado?



A mentira e seus efeitos

Esta é uma história fantástica: a história do Babaca de Porto Alegre, e de como uma advogada conceituada, discreta, estudiosa, de repente se viu jogada no meio de uma tremenda confusão, causada por uma mentira de internet. Vale a pena ler: está aqui. E, em outro link aí contido, mais histórias de hoax, as mentiras da internet que os jornais nem se preocupam em conhecer e desmentir.



As histórias do Babaca

O termo "babaca" já teve conotação chula, especialmente no Sul (no Nordeste, seu significado era outro). E, nessa época, chegou ao Jornal da Tarde, em São Paulo, o jovem jornalista mineiro Fernando Morais – hoje, o mais festejado biógrafo do país. Mais ou menos ao mesmo tempo, chegou o pernambucano Fernando Portela, de belíssimo texto, língua bífida e que trata dos dentes no Instituto Butantã. Os dois eram conhecidos como "Fernando". E o Fernando mineiro passou a chamar o Fernando pernambucano de Fernando Babaca, alegando que no Nordeste "babaca" queria dizer "xará". Portela devolveu o apelido – que, na devolução, pegou. Por algum tempo, Fernando Morais era o Babaca.

Mas ficava chato, naquele tempo de poucos telefones, berrar "Babaca!" quando a ligação era para ele. Pior ainda quando sua mãe, distintíssima senhora mineira, recatada e finamente educada, estava do outro lado da linha. Ele virou então "Fernando B." Ou Bê, para os íntimos.

O Bê costumava reforçar o orçamento fazendo matérias para o "Suplemento Feminino" do Estado de S.Paulo – especialmente, o que estava muito na moda naquele tempo, a coluna do que era "in" e do que era "out". Certo dia, escreveu que "out" era dona Yolanda Costa e Silva, esposa do ditador de plantão, general Costa e Silva. Até aí, tudo bem. O problema é que ele escrevia um monte de colunas e elas iam sendo publicadas uma por domingo. Veio o Ato Institucional nº 5, a ditadura envergonhada se transformou em ditadura escancarada, e aí saiu a matéria com dona Yolanda na coluna de "out". Assinatura: Fernando B.

O diretor de Redação do Estadão, Oliveiros S. Ferreira, esplêndido jornalista, homem de gigantesca cultura e muito bom de didática, foi então chamado a depor por algum daqueles ínclitos milicos empenhados em salvar a Pátria da corrupção e da subversão, e cheios de teorias mal lidas a respeito das conspirações antinacionais. O Oliveiros sabia como tratar essa gente: explicou, com toda a singeleza, que quando a coluna foi escrita era permitido criticar a mulher do presidente; portanto, não tinha sido por mal. O milico entendeu, mas implicou com um detalhe: se o autor da coluna se chamava Fernando Gomes de Morais, por que "Fernando B."?

Não, Babaca era impensável: seria a prova que o milico queria de que a imprensa estava contaminada por idéias exóticas e malsãs e pronta para corromper nossa juventude ingênua. Oliveiros pensou rápido: "É B. de bobo. Sabe, a gente na Redação acha que ele é bobo e o apelido pegou".

A explicação também pegou.

E veja como são as coisas: no momento mais feroz da ditadura brasileira ele escapou. E foi na Espanha redemocratizada, há poucos dias, que o Bê acabou sendo detido no aeroporto, confundido com um traficante português. Pode?



Notícias de fora para dentro

Por falar em suicídio jornalístico, o noticioso online Pasadena Now, da Califórnia, EUA, demitiu seus cinco repórteres e contratou seis operadores de call-center, indianos, residentes e domiciliados na Índia. Todos, claro, falam excelente inglês; nenhum é jornalista. Lêem os blogs e sites de Pasadena, os press-releases, a agenda das autoridades; acompanham o noticiário de TV via internet; conversam por Skype ou e-mail com as pessoas indicadas pelo pauteiro, e escrevem o noticiário.

Ridículo, não é? Mas não é muito diferente do que acontece em certos países, em que estagiários de primeiro ano de Jornalismo são colocados na chefia de noticiosos de internet, sem qualquer supervisão, e em que os boletins das agências noticiosas entram direto na tela, sem nenhuma leitura ou revisão. Há um caso curiosíssimo, de uma agência que transmite em espanhol e aqui faz uma tradução meia-boca, antes de enviar seus boletins para entrada automática em portais noticiosos diversos. Com freqüência é preciso imaginar o que estava escrito em espanhol, retraduzir e só então entender o que é que quiseram dizer com aquilo.

Em resumo, vale tudo para poupar salários. E, é óbvio, não vai dar certo.



Culpada ou inocente

O Ministério Público Federal de São Paulo decidiu processar a Rede TV! pelas entrevistas com a menina Eloá e seu namorado Lindemberg, que a seqüestrou e matou. É um caso muito interessante: este colunista, em sua época de editor, não permitiria que entrevistas assim fossem divulgadas. Mas a Rede TV! tinha o direito de divulgá-las, por que não? Se a polícia, que cercava o prédio onde estavam seqüestrador e seqüestrada, não impediu a aproximação de repórteres, não cortou a luz e ainda permitiu que uma refém libertada voltasse ao cativeiro, por que a rede não poderia, exceto por uma questão de ética, divulgar as entrevistas?

Há outro fato que merece ser analisado: por que só a Rede TV!? A Globo e a Record ficam fora por que motivo? Se este colunista se lembra bem, só a Bandeirantes não participou do circo dos horrores.



A morte e a morte da Tribuna da Imprensa

A Tribuna da Imprensa, importantíssima na história de nosso jornalismo, fechou por falta de dinheiro. Segundo Hélio Fernandes, diretor do jornal, a culpa é do ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, por adiar o julgamento de uma ação contra a União por prejuízos sofridos durante a ditadura. Com o dinheiro da indenização, Fernandes pretendia manter o jornal aberto.

É triste; mas a Tribuna da Imprensa já tinha morrido outras vezes. Morreu quando Carlos Lacerda, seu fundador e motor, a vendeu ao empresário M. F. do Nascimento Brito, dono do Jornal do Brasil, que não conseguiu desenvolvê-la; morreu outra vez durante a ditadura, quando Hélio Fernandes – que era um ótimo repórter, aguerrido e cheio de fontes – teve seu acesso à publicidade barrado por ordem do governo. Da democratização para cá, a Tribuna da Imprensa não teve oportunidade de recuperar o tempo perdido: renovar as máquinas, formar uma equipe competitiva, montar uma máquina de vendas, tudo custava mais dinheiro do que era possível levantar. Talvez o ministro esteja efetivamente demorando mais do que o habitual para tomar uma decisão; mas, de qualquer forma, é injusto responsabilizá-lo sozinho por um problema que já vinha há tantos anos.



Chapa branca

Estar no poder deve ter suas compensações: ser chamado de doutor, andar sempre com um séquito de amigos de infância (alguns dos quais o conheceram há dois ou três meses), usar carro oficial com chofer. E, naturalmente, receber títulos, medalhas, comendas. Este colunista, acostumado a Mercedes com chofer, acha essas coisas meio esquisitas; e sempre acreditou que esta seria a opinião corrente entre os colegas jornalistas.

Não é: Franklin Martins, ministro da Comunicação, arrastou seus dois metros de altura de Brasília para São Paulo, espremidos naquelas poltronas de avião que o ministro Nelson Jobim tinha prometido ampliar, para receber o título de Personalidade do Ano em Relações Públicas. Não, Franklin não é RP: sempre foi jornalista. Mesmo assim, agradeceu o prêmio, "sentindo-se gratificado por ter sido esse um reconhecimento ao esforço deste governo em valorizar a Comunicação e de o fazer em prol do Brasil". Aliás, nada como estar no governo para obter reconhecimento público por seus méritos nos mais diversos setores.



Como é mesmo?

De um grande jornal:

** "Bancos dispensam mais de mil funcionários em três meses"

Na matéria: "entre setembro e novembro, houve 774 demissões. Se for acrescentado o banco (...), que demitiu 200 na sexta-feira passada, o número sobe para quase mil".

O número está errado, mas é preciso convir que "mais de mil" dá título melhor que "quase mil". Claro que, por esse critério, também seria possível falar em "cem mil". Mas não é aqui que vamos dar essa idéia.



E eu com isso?

Há muitas denúncias sobre as urnas eletrônicas. Mas a solução simples é ignorada: testá-las na presença dos denunciantes. Ou as urnas são à prova de falsificação, e todo mundo tem de calar a boca, ou não são, e devem ser modificadas. Mas o pessoal prefere ficar em silêncio, esperando que todos esqueçam.

É como as velhas operações da Polícia Federal: muito estardalhaço, muita algema, muita TV. E depois, cadê o resultado dos inquéritos? Há operações já com um bom tempo de casa, e, coitadas! – parecem ter sido esquecidas.

Mas há coisas de que ninguém esquece: a vida dos famosos, por exemplo (até porque, se esquecerem, eles deixam de ser famosos). O noticiário é incessante:

** "Justin Timberlake diverte-se jogando golfe"

** "Com flor no cabelo, Elba Ramalho janta com amigas"

** "Gwen Stefani troca fralda do filho em um parque de Los Angeles"

** "Dado Dolabella aparece com moto diferente da que Luana deu"

** "Brad Pitt curte tarde de motoqueiro nos EUA"

** "Claudia Jimenez dá selinho em Paulo Vilhena na festa da ex"

É claro que, na sala de espera do dentista, o assunto não será a velha operação da Polícia Federal. Por que não o novo namorado da antiga estrela?



O grande título

Uma excelente safra, de grandes jornais e importantes portais noticiosos. Comecemos com um que permite várias leituras:

** "MP pede R$ 1,5 mi à Rede TV! por entrevista"

Não, nada de pedidos indevidos: o MP quer é multar a Rede TV! em R$ 1,5 milhão pelas entrevistas que fez no caso do seqüestro de Santo André.

Outro que também permite várias leituras:

** "Órgão quer examinar esgotos para avaliar drogas"

Há sempre uma certa malícia na cabeça das pessoas, não é mesmo? Mas imaginemos que o tal órgão consiga penetrar nos esgotos e encontre drogas. Considerando-se o tamanho da rede de esgotos, como identificar sua origem?

E, sempre o preferido deste colunista, o título que precisa de intérprete:

** "Roubo de privada termina com helicóptero"

Deve fazer sentido, se a gente conhecer a história toda. E é uma delícia imaginar a filmagem da cena.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Capitolina



XIII - Capitu

De repente, ouvi bradar uma voz de dentro da casa ao pé:
— Capitu!
E no quintal:
— Mamãe!
E outra vez na casa:
— Vem cá!
Não me pude ter. As pernas desceram-me os três degraus que davam para a chácara, e caminharam para o quintal vizinho. Era costume delas, às tardes, e às manhãs também. Que as pernas também são pessoas, apenas inferiores aos braços, e valem de si mesmas, quando a cabeça não as rege por meio de idéias. As minhas chegaram ao pé do muro. Havia ali uma porta de comunicação mandada rasgar por minha mãe, quando Capitu e eu éramos pequenos. A porta não tinha chave nem taramela; abria-se empurrando de um lado ou puxando de outro, e fechava-se ao peso de uma pedra pendente de uma corda. Era quase que exclusivamente nossa. Em crianças, fazíamos visita batendo de um lado, e sendo recebidos do outro com muitas mesuras. Quando as bonecas de Capitu adoeciam, o médico era eu. Entrava no quintal dela com um pau debaixo do braço, para imitar o bengalão do doutor João da Costa; tomava o pulso à doente, e pedia-lhe que mostrasse a língua. "É surda, coitada!", exclamava Capitu. Então eu coçava o queixo, como o doutor, e acabava mandando aplicar-lhe umas sanguessugas ou dar-lhe um vomitório: era a terapêutica habitual do médico.
— Capitu!
— Mamãe!
— Deixa de estar esburacando o muro; vem cá.
A voz da mãe era agora mais perto, como se viesse já da porta dos fundos. Quis passar ao quintal, mas as pernas, há pouco tão andarilhas, pareciam agora presas ao chão. Afinal fiz um esforço, empurrei a porta, e entrei. Capitu estava ao pé do muro fronteiro, voltada para ele, riscando com um prego. O rumor da porta fê-la olhar para trás; ao dar comigo, encostou-se ao muro, como se quisesse esconder alguma coisa. Caminhei para ela; naturalmente levava o gesto mudado, porque ela veio a mim, e perguntou-me inquieta:
— Que é que você tem?
— Eu? Nada.
— Nada, não; você tem alguma coisa.
Quis insistir que nada, mas não achei língua. Todo eu era olhos e coração, um coração que desta vez ia sair, com certeza, pela boca fora. Não podia tirar os olhos daquela criatura de quatorze anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, desciam-lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo. As mãos, a despeito de alguns ofícios rudes, eram curadas com amor; não cheiravam a sabões finos nem águas de toucador, mas com água do poço e sabão comum trazia-as sem mácula. Calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos.
— Que é que você tem? repetiu.
— Não é nada, balbuciei finalmente.
E emendei logo:
— É uma notícia.
— Notícia de quê?
Pensei em dizer-lhe que ia entrar para o seminário e espreitar a impressão que lhe faria. Se a consternasse é que realmente gostava de mim; se não, é que não gostava. Mas todo esse cálculo foi obscuro e rápido; senti que não poderia falar claramente, tinha agora a vista não sei como...
— Então?
— Você sabe...
Nisto olhei para o muro, o lugar em que ela estivera riscando, escrevendo ou esburacando, como dissera a mãe. Vi uns riscos abertos, e lembrou-me o gesto que ela fizera para cobri-los. Então quis vê-los de perto, e dei um passo. Capitu agarrou-me, mas, ou por temer que eu acabasse fugindo, ou por negar de outra maneira, correu adiante e apagou o escrito. Foi o mesmo que acender em mim o desejo de ler o que era.